segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Página 129

Depois do último amor, ela tinha decidido que não ia mergulhar mais em palavras que não eram as suas. Não ia voltar a dedicar excertos de textos ou letras de canções. Não ia voltar a usar frases de outras canetas ou teclas para agarrar o amor de alguém. Não. Não. E não. 
Mas o Natal trouxe-lhe dois livros de poesia. Em vez de "Boas Festas", o postal do saco colorido trazia instruções claras, uma página específica. Não foi preciso procurar: já estava marcada com uma folha. Caligrafia pouco legível e uma dedicatória de tamanho A4. Afinal, ainda havia alguém que a fazia ficar de lágrima a descoberto no meio de um sorriso. Acabava sempre por resvalar tudo para a pieguice do amor. Paciência. Agora já estava. Tudo de novo. Uma vez mais. O medo, a insegurança e a vontade do para sempre. Mas ele deu-lhe o seu poeta preferido, aquele que ela nunca conseguia encontrar no meio de prateleiras e prateleiras de livrarias pela cidade fora - ele merecia o benefício da dúvida. Que no final de contas, o poema que ela mais tinha gostado nessa noite fora a prosa que ele encaixara nas quadrículas que marcavam o soneto da página 129.


"Não sei nunca se é isto exactamente
o que chamam amor - esta vontade
de imaginar assim a força que há-de
tornar-nos mais felizes de repente"
Fernando Pinto do Amaral

1 comentário:

ana disse...

foi meu professor de escrita criativa!:) que livro é esse?
* beijinho, escreves tão bonitinho....