domingo, 24 de fevereiro de 2013

Facing the Ocean, the Warmth of Spring Is Blossoming

From tomorrow, I will be a lucky person
Feed horse, chop wood, travel the world
From tomorrow, I will think of my health and eat more vegetables
I will have a house facing the ocean; the warmth of spring will blossom

From tomorrow, I will write to my family
Tell them I am settled, I am calm
A warmth will radiate through my life
It will radiate to everyone in this world
From tomorrow, each river and each mountain
Will be given a new and tender name

Strangers, I will also wish you happy.
May you have a brilliant future!
May your lovers eventually become spouse!
May you enjoy happiness in this earthly world!
I only wish to face the sea, with spring blossoms.

Cha-Haisheng
(conforme o que aparece em "Twenty Fragments of a Ravenous Youth" de Xiaolou Guo)

Fotografia licenciada em Creative Commons.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

#26


"E não há um dia em que seja diferente,
como um indício da gente falar os dois frente a frente...
Será porque tu nada sentes ou...?
Porque eu nada tento? 
Sou tímido por dentro.
À espera que o tempo revele o que ninguém mostrou..."


Toda a gente tem problemas. E quem não tem problemas também não tem o mínimo interesse. A história que cada um traz é que nos molda. E encontramos nas confusões diárias, internas ou externas, as definições das nossas personalidades, ambições e convicções. Tudo em jeito de luta permanente, que isto de ser humano pressupõe uma boa dose de persistência, quase até de dedicação. Entre o coração e a razão, existe um ringue de boxe que nunca pára de nos pôr à prova. A arte que conseguimos absorver ou criar acalma-nos no meio da batalha. O hip-hop serve o propósito de ser mais uma metáfora da vida: andamos sempre à cabeçada com qualquer coisa e fazemos da poesia o antídoto para cada mal - a inaptidão, a indecisão, a solidão, e outras coisas acabadas no mesmo ditongo. Tu sabes. Descobrir os nossos problemas (e, de certa forma, os problemas dos outros também) é o que nos faz desenhar refrões mais bonitos, simultaneamente simples e complexos, numa espécie de ritual de aperfeiçoamento perpétuo. Todos os dias, um desafio novo - procurar a tarola certa para embalar os nossos dias.

Fotografia licenciada em Creative Commons por  ::ZEN::

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

#25

"Eu juro,
Temos tudo para vingar na vida:
frutos, laços, talvez em demasia. Eu juro.
(...)
Pois tudo falha, tudo muda.
Amanhã, tudo diferente
Tudo pode dar certo.
Aqui na Terra não é um inferno, é um sonho que se realiza
Vamos todos ser tijolos deste muro que nos une."

E esta porra desta bola gigante que nunca pára de girar. De mudar. De nos obrigar a crescer e a inventar novas formas de sobreviver ao nevoeiro que se atravessa todos os dias nos intervalos entre os nossos olhos e as nossas lentes. Ninjas suburbanos. Poetas do asfalto. Todos nós, de mãos dadas, numa rodinha à beira do precipício, em plena preparação para o apocalipse. Somos uma seita de zombies, eternamente artistas, à espera do Juízo Final. Telas ao alto! Pautas ao alto! Cadernos ao alto! Humanos ao fundo, que esta merda já não se aguenta. Pai nosso, pai vosso, pai de quem quer que seja. Não te preocupes. Vai correr tudo bem.

domingo, 30 de dezembro de 2012

#24

Tenho lido muita banda desenhada. O que significa que tenho lido muito. Ou, não sendo muito, tenho lido mais do que os últimos anos me têm deixado. É certo que a tecnologia ajudou, mas não fosse a derradeira força das palavras (e das imagens) e não estaria tão aconchegada esta noite. O hip-hop também tem tomado bem conta de mim. Parece que encontro de mim nos versos alheios aquilo que sei de cor mas não conheço. Ando sempre a nadar fora de pé. O sossego chega com o conforto de saber que não estou sozinha. É por isso que gosto de ler: porque aquece e arrefece o que está cá dentro, qual microondas de sensações. Quando abraçamos a língua com delicadeza, ela devolve-nos esse amor nas mesmas proporções. Na incerteza com que o mundo palpável nos brinda, salvam-nos as frases vagarosamente depuradas e as imagens feitas filosofia. Sim, as personagens dos livros são os retalhos das vidas em que tropeçámos algures. Nos quadradinhos deste álbum, os balões atafulham-se com letras manuscritas. Cada um com a sua tipografia, como se os ângulos de um símbolo definissem um pouco mais daquilo que somos. Ou do que fomos. Todos os dias, de capa ao pescoço. Heróis de narrativas que nunca vão ser deslindadas por outras pessoas. A conquistar identidades entre ser sujeito e qualquer predicado da existência.

in "Asterios Polyp" de David Mazzucchelli

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

#23

Deixou-se levar. Foi a uma daquelas lojas onde noventa desportos se arrumam em (sabe Deus quantos) metros quadrados e escolheu a tenda mais fácil de montar. Uma daquelas que se atiram ao ar e ficam prontas num instante. O plano era simples. Ir ter com ele e acampar ali, ao seu lado. Não queria invadir nada. Na verdade, a tenda serviria apenas os momentos pontuais em que quisessem estar juntos. O amor feito aparelhagem. (Play, pause, play.) Esperar pelo timing certo. O amor feito dj set. Acertar o tempo de cada disco até encaixar. (Pitch para cima, pitch para baixo.) Não que seja importante saber utilizar um crossfader para sobreviver a um acampamento. Até porque nestas histórias costuma resumir-se tudo à figura do príncipe encantado, e toda a gente sabe que a realeza não só não acampa, como (regra geral) percebe muito pouco deste tipo de geringonças. Mas ela não procurava um príncipe. Na verdade, queria ser ela a princesa. De headphones na cabeça, a escolher refrões de depuração requintada, como se as bpms acelerassem o coração em sintonia com as hormonas. Afinal, dizem que o amor é cerebral e (cientificamente) quase uma ilusão. Seria bom poder desenhar um cenário com a banda sonora perfeita. O ideal era mesmo acampar longe dali. Numa casa qualquer, onde houvesse um bom sistema de som. O amor são dois discos. Basta tocá-los à velocidade certa.

Fotografia licenciada em Creative Commons por Marco Wessel.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

#22


Capicua - "Casa no Campo" from MPAGDP on Vimeo.

"Diz-me qual é o teu perfume favorito.
- Pão quente, terra molhada e manjerico."

Mergulhar em livros de ficção e de ciência atravessada entre as histórias, enquanto se mudam páginas digitais à velocidade da luz. A tinta é electrónica, mas, muito para lá das palavras, o amor ainda reina em formato analógico. E as frases mais bonitas entopem os servidores da humanidade que é gostar de alguém. Desculpa-me, o desenho dos laços que queremos atar nunca fica perfeito e, volta e meia, desemboca no malfadado "404 Error". Esta vida é uma selva, mas eu preciso de sopas e descanso. Quero uma casa no campo.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Esplendor


Há músicas que sussurram mais alto aquilo que não conseguimos dizer. E adoptamo-las devagarinho numa espécie de busca incessante pela plenitude da comunicação. Os desastres do coração, os laços que atamos e desatamos ao longo dos dias, as expectativas e as promessas quebradas parece tudo largado ao seu expoente máximo quando nos agarramos aos substantivos de outras vozes. O esplendor da chuva que cai lembra os filmes que nunca vimos e as cenas que gostaríamos de protagonizar. Delicadamente, como se a subtil violência das letras alinhadas nos trouxesse novos planos. Grandes planos de cores cintilantes, dignos de um qualquer trabalho publicado no Vímeo. 

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

#21

"De tanto me devotar ao meu ofício, escrevendo e reescrevendo, corrigindo e depurando textos, mimando cada palavra que punha no papel, não me sobravam boas palavras para ela."

in Budapeste, Chico Buarque de Hollanda

O romance que estava a ler não cheirava a bossa-nova. Na verdade, era uma espécie de crónica alargada sobre histórias de amor desafinadas pela falta de polimento. Afinal, os dramas cariocas viviam alinhados com os seus: vivia fascinada com as problemáticas das relações humanas. Obcecada com o amor e com a vontade de ter um par que a acompanhasse nas restantes danças da sua vida. Mas parecia que a sucessão ininterrupta de dias e noites trazia mais complicações que facilidade. Os nós que nunca se desatavam obrigavam-na a investir mais tempo naquilo, como se o tempo significasse qualidade. O trabalho espremia-lhe a vontade e a capacidade de execução de provas de romantismo exacerbado. As declarações fugiam-lhe entre os dedos, esgotadas pelos intermináveis textos que escrevia no horário de expediente. E nem sequer podia entregar-se escondida nos poemas dos outros, que ele não lia versos. Ainda assim, a ironia do destino parecia querer alinhar aquela existência conjunta. Na ausência prolongada que a jornada laboral ditou, ele disse-lhe que pensar em futuros hipotéticos a dois o desconcentrava. "Escreve-me", ouviu-se do outro lado do telefone. Não podia dizer que não. Por isso, foi comprar um dicionário, na esperança de encontrar todos os sinónimos da palavra amor.

Fotografia licenciada em Creative Commons por babi mouton.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

#20

O problema das declarações de amor, ou de qualquer outra intenção, é que às vezes são mesmo verdade. A mania que as pessoas têm de traduzir o que sentem por palavras define grande parte do que somos, nem que seja pela doçura que imprimimos nas frases com que confrontamos o outro lado. É sempre melhor quando a ternura invade o que queremos dizer, mesmo que queiramos definir novas tragédias. No fim do dia, os poemas parecem sempre mais bonitos quando não é a nossa mão que os escreve.


quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Fundamentalismos Cívicos #3

Sobre isto.

São dias tristes. Reestruturar um jornal como o Público devia significar a uma aposta forte em mais conteúdos multimédia, sim (até porque um bom meio de comunicação online não deve viver só do texto com uma fotografia ao lado), mas também em jornalismo de investigação e jornalismo especializado. Reestruturar devia ser sinónimo de melhorar.
Infelizmente, em Portugal, os verbos já quase nunca significam o que é suposto e as "reestruturações" de hoje em dia são, na verdade, devastações industriais onde os senhores do dinheiro ditam os serviços que cada um precisa/gosta/adquire. Eu precisava e gostava do Público como ele sempre foi: impresso. Não o comprava todos os dias, confesso, mas gostava de o fazer sempre que podia e/ou me interessava.
Mais uma vez, um obrigada aos grandes grupos económicos nacionais por nos tirarem o pouco que resta da pluralidade de imprensa e do acesso à informação. E, claro, por utilizarem o seu poder de investimento em destruir as partes boas da nossa sociedade em vez de melhorá-las.
Aos 48 colaboradores do Público a quem calhou o verbo "despejar", espero que um dia deixemos todos de ser um número.